No dia 27 de maio, andando pela Praça do Campo Grande em Salvador, parei para ver o movimento dos fãs de Ivete Sangalo que se aglomeravam na entrada do condomínio onde mora a cantora. Lembrei dos anos 80 e do sucesso popular de Gal Costa, que morava no mesmo prédio. Frevos no carnaval, programas de TV, capas de discos... Imaginei os fãs de Ivete exibindo LPs como estandartes, ilustrando e colorindo aquela tietagem performática. Pensei em entrar no meio deles com meus colegas da UFBA empunhando vinis de Gal Costa... Desde esse dia passei a levar os elepês de Gal para passear comigo, para que respirem novamente os ares das ruas onde, em outros tempos, transitavam das lojas para as casas, das casas para as festas, para outras casas, escolas... Além da arte e da perfomance, confesso que essa ação consiste basicamente em algo que não cabe em mim sozinho e por isso divido, tornando-me exposição ambulante pelas ruas das cidades e convidando as pessoas para interAÇÕES originais onde quer que estejam e sem manual de instruções. A ação terminou quando a musa lançou seu disco "recanto" em dezembro de 2011.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Arte-vida-tempo-espaço


   Desde que comecei a ação “levando os elepês de Gal para passear”, as pessoas passaram a contribuir com diversos assuntos sobre esse projeto: a arte-vida na contemporaneidade, a performance, os vinis, o lado A e o lado B,  as capas de discos, a naturalidade de antes e o fotoshop de hoje na cara dos artistas, os anos 80, a música popular brasileira, o ato de mostrar aos outros o que você ouve através do disco que carrega no braço, e, principalmente, a beleza e a voz de Gal Costa. 

   A maioria dos que se apresentam para falar comigo nas ruas e nas redes sociais, são admiradores da cantora e dizem ter saudades da época desses elepês onde os agudos e os “gritos” eram parte importante em sua obra. Hoje, com a participação de meu querido amigo Edu Oliveira em seu blog “o corpo pertubador” falando sobre esse projeto, onde cita um amigo de São Paulo que viria a Salvador somente para pedir a Gal, pelo interfone de seu apartamento, que voltasse a “gritar” e a explorar os famosos agudos que faziam parte de suas performances em shows e em disco até inicio dos anos 90. Entendo bem essa saudade, tanto a dele quanto a de outros fãs da cantora, pois também adoro ouvir as gravações dessa época. Mas, com o tempo, nesses quinze dias de passeios pela cidade de Salvador, senti que era necessário dizer que, particularmente, não tenho saudades dessa fase em que Gal gritava, nem do repertório transgressor, nem dos vestidos brilhantes, nem das corridas e jogadas de cabelo no palco. Gosto exatamente das mudanças, do passado e do presente, por poder acompanhar todo seu processo artístico onde praticamente se reinventou a cada década. Eu tinha apenas 12 anos quando percebi pela primeira vez a mudança na voz e na atitude da cantora que eu sou fã desde que nasci por intermédio de meus pais. Assisti pela TV uma apresentação no Teatro Castro Alves em que cantava “Dora” de Dorival Caymmi e fui arrebatado pelo jeito com que ela explorava os graves que a maturidade lhe presenteava e com a força que cantava aqueles versos, para frente, e não para cima como interpretava a mesma  música nos anos 80. Um jeito novo que tinha a ver com aquele tempo, com aquela idade, com aquela Gal... Essa mudança, que também pode ser observada dos anos 60 para os 70, e dos 70 para os 80, continuou acontecendo e continua me emocionando. Em 2001 quando regravou "Índia" de maneira muito sofisticada, clara, suave e elegante, pude perceber o que a nova Gal Costa mostraria naquela década. Foi muito cobrada pelos fãs e pela crítica, talvez por não se conformarem que o tempo pegou pra ele aquela imagem e voz quase mística da cantora dos anos 70 e 80. Hoje eu também gosto de tudo que ela faz: das bossas novas e tropicais, de todos os amores, de todas as coisas, onde a maturidade e simplicidade com que apresenta o repertório clássico da musica brasileira combina com a sofisticação de seu canto atual, com sua vida e atuação como artista nesse país que tanto se orgulha de sua contribuição em momentos importantes de sua história. Temos várias vozes e mil caras em uma só cantora. Quem quiser pode escolher sua preferida a cada 10 anos desde 1965. Eu escolho todas. Chega de saudade! Meu passeio pela cidade com os  elepês de Gal é também um grito, não pela saudade, mas pela ansiedade de esperar a nova Gal Costa dessa nova década de 2011. Além da arte, da performance, e de todos os motivos que explico na apresentação desse projeto, tenho que confessar que essa ação consiste basicamente nisso, em algo que não cabe em mim sozinho e por isso divido. Enquanto esse disco novo não estiver rodando na minha vitrola, continuarei levando os outros para passear. 
   Termino com as lindas palavras de meu amigo Edu, para reverenciar a sensibilidade de quem transcende arte-vida-tempo-espaço através de uma imensa voz: "...Mudamos e nos transformamos a cada instante e o que de nós fica no outro é, muitas vezes, uma imagem congelada que não podemos mais corresponder. Não é alegre nem triste. Simplesmente é."



Gal canta "Dora" de Caymmi no show "Baby Gal" em 1984.


Gal canta "Dora" de Caymmi no Teatro Castro Alves em 1993.

15 de junho

Hoje tive uma surpresa com as palavras de meu querido amigo Edu Oliveira falando sobre os elepês em seu blog "O Corpo Pertubador" ( http://ocorpoperturbador.blogspot.com/2011/06/os-elepes-de-gal-de-arthur.html?spref=fb)
Fiquei emocionado com sua leitura sobre essa ação. Edu captou tudo com poesia e me deu  certeza de que muita coisa ainda acontecerá quando tiver a  participação de artistas, amigos, leitores de blog, transeuntes, fãs de Gal Costa e qualquer um que queira contribuir nesse processo. Posso dizer que o corpo e a cabeça ficaram um pouco "perturbados" e estou tentando escrever o motivo...



Com a amiga Aila Canto na Escola de Belas Artes
Registro: Cássio Eduardo


Pausa para um café.


Encontro com Ludmila Britto no ônibus durante o eclipse da lua.
Rio vermelho

15 de junho, 2011